À conversa com: LILIANA
(Digníssima esposa do Armando ‘carinhas’ Aires)
(Digníssima esposa do Armando ‘carinhas’ Aires)
De algum modo entusiasmado com as memórias aqui divulgadas, do nosso amigo e companheiro Fernando Sampaio, e até em resultado de uma menção por ele feita, decidi conversar um pouco com a dita Liliana (uma das pessoas que ainda têm memória, mas haverá mais), dando assim início (espero eu) a um ciclo que possibilite ressuscitar recordações das gentes antigas de Paço de Arcos (que não velhas).
Aqui vai o relato, dividido em três secções principais:
A Liliana recorda-se vagamente da peça referida pelo Bardino Fernando Sampaio (aqui há Fantasmas????), mas teria pouco texto, daí preferir recordar outras.
"Logo a seguir (à peça referida pelo Fernando Sampaio) veio a "História de Portugal", que foi feita com apoio da escola, porque era a história de todos os reis Portugueses. Esta peça foi há 57 anos. Tinha eu 10 anos. Andávamos todos na 4ª classe.
Quem encenava era o Tavares que tinha muito jeito e a Bébé (Isabel Castro) também ajudava. A Bébé ia quase sempre pintar-nos, e como tinha também conhecimentos de guarda-roupa, era ela quase sempre que tratava dessa parte. Trazia a roupa emprestada dos teatros. Já viste o que era os nossos reis todos vestidos a rigor, desde a rainha Santa Isabel, a Dª. Inês de Castro, etc.?
Os papéis principais foram o D. Afonso Henriques feito pelo Américo Bravo que já morreu, a D. Inês de Castro, que seria morta depois, com os filhos príncipes, todos vestidos a rigor.
A Rainha estava sentada num cadeirão muito bonito, tudo vindo de casas muito ricas de Paço de Arcos. Ela muito bem vestida, ouve barulho e pergunta “És tu que vens da caça, meu senhor?”, e vê entrar os três que a mataram, encapuçados, os miúdos fogem para debaixo do maple, mas eles matam-na e matam um dos miúdos.
Quem fazia de Rainha Santa Isabel era a Tanica que era dos Lynce, uns irmãos gémeos que moravam na Fonte de Maio, e tinha um irmão que era o Tonico.
O peça tinha dois actos, cada um com dois ‘compéres’, um rapaz e uma rapariga, com vários quadros (cerca de 6) cada.
No princípio (compére) era o Américo Bravo a fazer de saloio, porque tinha vindo há muito pouco tempo do Alentejo e ainda falava daquela maneira típica, e a Tanica que era toda espevitada, uma menina criada aqui com famílias bem, que eram os Lynce.
Começava com ele a perguntar a ela:
- Ó menina por favor (ele vestido à saloia e ela toda vestida de organdi, cheia de folhos como se usava na altura) pode-me dizer onde mora o professor?
Ela olhava para cima para ele, porque era baixinha e gordinha, e dizia:
- Professor? O professor mora ali, mas porque é que tu queres saber? Virás para a escola também?
E ele responde:
- Ai, se me ensinassem era uma esmola, pois não sei ler nem escrever nem nunca vi uma escola.
- Então vou-te dizer onde mora o professor, para tu poderes ir para a escola, mas vais ver já como os nossos reis eram grandes.
Então fecha o pano e aparece o primeiro Rei.
- Eu sou D. Afonso Henriques, o primeiro Rei de Portugal, e esta coroa com que me vês conta as guerras que eu ganhei.
Olhava para a plateia. Assim como quem estivesse á procura e dizia:
- Se houver Mouro pimpão que se atreva a um desafio eu faço dele um esfregão um corrupio.
Depois parava e dizia:
- Já vi, perderam o pio (como quem diz, já não há gente para lutar).
Depois fecha o pano, e vêem outra vez os ‘compére’, e ela diz:
- Então gostaste do primeiro Rei de Portugal?
Ele responde:
- Gostar, gostei mas deu-me vontade de ir aos fagotes ao Rei (porque ele perguntava se havia alguém para lutar).
E ela diz:
- E nasceu gente muito boa, por exemplo a nossa Rainha Santa. Queres ver como ela foi generosa?
Sobe o pano outra vez. Aparece a Rainha Santa muito bonita com o manto caído e as criadas do Rei a porem pão. Ela tinha dois mantos e um estava dobrado.
Quando aparece o Rei, pergunta:
- Senhora que levais vós no vosso manto?
E ela diz com um ar muito triste e apavorado (bem ensaiado):
- Senhor, senhor, são rosas meu Senhor!
- Rosas em Janeiro? Pergunta o Rei. Não é coisa vulgar, mas mostrai-me primeiro para que eu possa acreditar.
Ela olha para o céu, põe as mãos e deixa cair o manto caindo as rosas (do manto de dentro), e ele então ajoelha-se no chão e diz:
- Ó milagre Santa, ó milagre Santa, perdoai-me por não estar habituado a ver estas bondades nas vossas mãos.
Então beija-lhe a mão.
Cai o pano.
Vem a ‘compére’ a chorar, e pergunta:
- Então gostaste da nossa Rainha?
D. Afonso Henriques, D. Dinis, a Rainha Santa Isabel, a D. Inês de Castro e mais dois ou três completavam o primeiro acto.
Depois vieram outros ‘compéres’. Lembro-me que ela era uma rapariga chamada Lina que queria ser hospedeira de bordo, e foi, e morava no mesmo prédio do meu tio António, por cima da loja das bicicletas, com uma tia.
Os ‘compéres’ estavam ao contrário. Ele é que era um senhor.
Aqui entravam o D. Nuno Álvares Pereira, o Gungunhana, muito gordo (quem fazia o papel era o Ramiro Boavida - filho da Arlete Boavida – e que também fazia muitos papéis como eu, e que morava na Fonte de Maio; infelizmente morreu o ano passado).
Entretanto para dar tempo à mudança dos cenários, havia sempre coros, e poesia ou ballet com a Margarida Castro e Silva, que também entrava nas peças de teatro porque dançava muito bem; andava no ballet em São Carlos.
O Ramiro, era gordo e pequenino, (já a mãe era uma mulheraça; a filha dele - que é muito forte - é agora professora na creche), mas muito engraçado, sentado no chão de tanga e acorrentado, todo pintado de preto, com uma grande cabeleira.
Havia também no segundo acto a Padeira de Aljubarrota que era eu, o Rei da Restauração, D. João IV, etc.
Enquanto éramos pintados vinha a Tanica dizer o poema ‘A neve’:
-Batem leve, levemente como quem chama por mim; será chuva será gente; gente não é certamente e a chuva não bate assim; talvez uma agulha bolia na quieta melancolia dos pinheiros do caminho; fui ver, a neve caía do azul cinzento do céu; branca e fria há quanto tempo eu a não via; etc. Levou muitas palmas, as pessoas ficaram comovidas.
Outro era a dizer o ‘Dia de anos’:
- Com que então caiu na asneira de fazer na quinta-feira 26 anos; ainda se os fizesse, mas fazê-los não me parece de quem tem muito miolo; não sei quem me disse que fez a mesma coisa que o ano passado; etc.
As vestes eram a condizer, para ‘A neve’ vinha toda de branco, para o ‘Dia de anos’ vinha toda enfeitada.
Eu era a papoila. Dizia um poema que começava assim:
- Vista do alto da serra com um ar muito tolo nasceu num monte de terra, dona papoila …. Já não me lembro de mais porque era muito grande. Era de um autor português que, salvo erro se lia no primeiro ano.
Havia outra que era muito gira que se chamava ‘O balão’ que vinha no mesmo livro:
- Houve festa, houve bolo, rebuçados e muitos balões, e no fim a mãe disse ao filho, vamos para a cama que já é tarde; abriu a janela e ele disse: mamã, mamã, olha, olha; a mãe olhou, viu a lua mas pensou e disse para o filho: aquilo meu filho é o balão do menino Jesus; e deitou o menino. No outro dia o menino saltou da cama, abriu a janela e gritou: mamã, mamã o menino Jesus rebentou o balão.
Havia também hinos, o dos marinheiros:
- os marinheiros aventureiros, são sempre os primeiros ….etc. Cantavam todos muito afinadinhos, vestidos a rigor, por exemplo neste estávamos todos vestidos de marinheiros, e quem arranjava os trajes era a Bébé.
Lembro-me de lhe dizer que o Sr. Virgílio (Tavares) não tinha arranjado um fato para o número da padeira de Aljubarrota, e ela responder:
- isso não tem importância. Pedes á tua mãe uma saia rodada daquelas de lavar a roupa, e um avental e depois uns sapatos, ou tamancas, que ainda é melhor, e a gente vai ao Félix pedir uma padeira. A pá era tão grande e tão alta que eu quase não podia com ela, enquanto dizia: Se houver um espanhol que se atreva a desafiar-me, eu faço dele uma carcaça, um pão grande que ponho no forno a assar. Começava assim: eu sou uma mulher do povo, grande, valente e honrada que nasceu do nosso povo para servir a Pátria amada; depois vinham os espanhóis, metiam-se lá dentro e eu pegava na minha pá e tinha que balançar. Mas a pá era muito grande e aquilo deu uma risada enorme.
Mas foi muito bonito. Era a história de Portugal toda.
Além do D. Afonso Henriques, havia o D. Dinis, que entrou de enxada e pinheiros na mão para plantar o pinhal de Leiria, a Dª. Isabel, D. João, a Dª. Filipa de Vilhena (que era a Gualdina), a armar cavaleiros os filhos. Depois foi o D. Nuno Álvares Pereira na batalha de Aljubarrota, etc., até ao Salazar, que foi o último quadro.
- O Salazar, que era o Paulo Brás, fez uma homenagem às mães de Portugal. Muito bem caracterizado, com óculos, cabelos grisalhos, ar sério. As mães de Portugal, eram todas as mães, as criadas de servir, operárias, que apareceram depois da guerra do Hitler, as mulheres do povo sem serem pobres, que já iam bem vestidas, e as senhoras de vestido, salto alto e mala, e de chapelinho. Eu era a primeira senhora. Como tal fui logo recebida, fiquei ao pé dele e fui a única a ficar sentada, as outras ficaram em pé. Eu dizia que ele era um grande estadista e que não achava bem que não gostassem dele, porque ele era o único que tinha evitado a guerra civil em Portugal (a senhora que eu representava sabia muito de política). Ia vestida com um ‘tailleur’ da minha irmã que se tinha casado há um ou dois meses. Atrás tinha um grande alfinete porque eu era muito magrinha, salto alto com algodão e barbas de milho á frente para os pés não escorregarem nos sapatos, e lá ia eu trocando as pernas (estava mais habituada a andar descalça).
O quadro do Carmona também foi muito giro, mas eu não entrei, porque era logo a seguir e não tinha tempo. Apesar de saber os papéis todos do princípio ao fim.
A professora na escola dizia-me:
- Pois, do teatro sabes tudo, mas aqui nem por isso.
Quando alguma estava doente nos ensaios, era eu que ia substituir. Quem fazia de Carmona era o Tonico que era muito bonito. Com uma cabeleira branca, farda do exército, etc.
A seguir foi a Nau Catrineta.
Os mais pequenos andávamos no palco, que era a nau, com garfos e facas a perguntar aos outros:
- Tens aí alguma coisa para o almoço? e eles respondiam:
- Não, só se for…, olha toma lá o meu cinto e põe de molho; era uma altura que não havia nada para comer.
O comandante era o irmão do Reinaldo, o João Vasco (actual Director do Teatro Experimental de Cascais), que é hoje artista de teatro.
Como o Tavares arranjou um trabalho em Lisboa, foi ele que organizou mais a Nau Catrineta.
Eu era a fada. Eu tinha que ser sempre a principal porque ele gostava muito de mim.
O comandante estava no cais e dizia:
- Já vejo no horizonte novas caravelas, que novas me trarão? Será Diogo Cão? Será a Nau Catrineta?
A peça era a vida a bordo, com os marinheiros a subirem os mastros dizendo:
-Meu comandante, meu capitão, não vejo nada senão areias; e eles perguntavam:
-Mas serão areias de Portugal? Mas eles não viam mais nada porque a Nau Catrineta desapareceu, nunca chegou a terra.
Eu era a fada que entretinha as filhas do comandante que também iam a bordo, porque se elas estavam sem fazer nada, nunca mais passava o tempo. Cantava a história do relógio, vinha com a varinha e tocava numa e dizia:
-Tu agora és um relógio, e aparecia um relógio que começava a dar horas. Eu como era a fada andava pela Nau toda e quando via alguém triste tocava com a varinha e dizia (por exemplo): não estejas triste, pensa que estás a comer um bom bocado de comida; e aparecia á frente dele um prato de comida.
Eu era uma miúda de doze anos muito loira e bonitinha, cabelos muito compridos e encaracolados (com papelotes da véspera), vestida com aqueles fatos que eu adorava, sentia-me mesmo fada. Tinha poucas falas, porque como não havia muito que fazer a bordo, cantava-se muito.
Quem também trabalhou muito para esta peça foi a Bébé, que ainda mora ao pé da Oceania.
Os mais pequenos andávamos no palco, que era a nau, com garfos e facas a perguntar aos outros:
- Tens aí alguma coisa para o almoço? e eles respondiam:
- Não, só se for…, olha toma lá o meu cinto e põe de molho; era uma altura que não havia nada para comer.
O comandante era o irmão do Reinaldo, o João Vasco (actual Director do Teatro Experimental de Cascais), que é hoje artista de teatro.
Como o Tavares arranjou um trabalho em Lisboa, foi ele que organizou mais a Nau Catrineta.
Eu era a fada. Eu tinha que ser sempre a principal porque ele gostava muito de mim.
O comandante estava no cais e dizia:
- Já vejo no horizonte novas caravelas, que novas me trarão? Será Diogo Cão? Será a Nau Catrineta?
A peça era a vida a bordo, com os marinheiros a subirem os mastros dizendo:
-Meu comandante, meu capitão, não vejo nada senão areias; e eles perguntavam:
-Mas serão areias de Portugal? Mas eles não viam mais nada porque a Nau Catrineta desapareceu, nunca chegou a terra.
Eu era a fada que entretinha as filhas do comandante que também iam a bordo, porque se elas estavam sem fazer nada, nunca mais passava o tempo. Cantava a história do relógio, vinha com a varinha e tocava numa e dizia:
-Tu agora és um relógio, e aparecia um relógio que começava a dar horas. Eu como era a fada andava pela Nau toda e quando via alguém triste tocava com a varinha e dizia (por exemplo): não estejas triste, pensa que estás a comer um bom bocado de comida; e aparecia á frente dele um prato de comida.
Eu era uma miúda de doze anos muito loira e bonitinha, cabelos muito compridos e encaracolados (com papelotes da véspera), vestida com aqueles fatos que eu adorava, sentia-me mesmo fada. Tinha poucas falas, porque como não havia muito que fazer a bordo, cantava-se muito.
Quem também trabalhou muito para esta peça foi a Bébé, que ainda mora ao pé da Oceania.
3) Memórias a avulsas
Fizeram-se muitas representações no cinema.
A Floripes tem memória de muitas coisas, porque também era grande entusiasta do teatro. Antes do meu tempo, também houveram muitas peças representadas no clube, com ela a minha irmã Preciosa e a minha cunhada Conceição.
Quem fazia todas as encenações eram o Tavares (que era professor, e estava proibido de dar aulas por razões políticas) e a Bébé. Este Tavares era filho da nossa professora, mas estava mais adiantado, porque a mãe só tinha a quarta classe. Ele é que ensinava a admissão ao liceu e dava explicações para o primeiro ciclo do liceu.
O João Vasco gostava muito de mim. Quis-me levar para o teatro, a minha mãe é que não deixou. Ele era muito meu amigo, as pessoas até pensavam que éramos namorados, mas não até porque ele nunca gostou de mulheres. Ele era o nosso ídolo. Tem mais dois anos que eu mas adorava-me. Ainda um dia destes perguntei á irmã como se chamava ele, porque para mim era sempre o Fernando.
Eu não fui para o teatro porque a minha mãe não me deixou. Primeiro era preciso dinheiro e eu tinha que trabalhar. Ela não se importava, mas eu tinha que me sustentar, vestir e calçar, e o teatro não dava dinheiro. Tinha 12 anos e o meu pai já não podia sustentar-me.
Em conversa um dia destes com o Paulo Brás perguntei-lhe:
- Tu lembras-te das peças de teatro?
- Se me lembro, eu fazia, nem quero que saibam agora, fazia de Salazar.
- Olha eu, como sabes fazia teatro, entrava em todas a s peças, ali em baixo no clube primeiro e depois passou para o cinema (Cine Teatro de Paço de Arcos) porque era maior e as pessoas tinham onde se sentar. As pessoas iam de graça, algumas davam qualquer coisa, para a ajuda das despesas que eram muitas.
Um dia destes vi a Tanica. Ela e a Nani (irmã do Pereira Júnior), eram muito amigas, as mães também eram muito amigas, eram ricas, andavam nos chás, não andavam com a minha mãe. Mas elas andavam connosco, eu era pobre, até podia andar descalça mas ia comer a casa delas.
A Tanica, não consigo lembrar-me qual era o nome, mas tenho a impressão que era Teresa, casou com o filho do dono dos fogões Hipólitos, que na altura era coisa boa; a cabeça do fogão nunca se estragava, enquanto os outras custavam dez escudos, os Hipólitos custavam 50 escudos. Eu fui lá ver com a Nani, ali na Lapa, uma casa muito chique, uma vivenda muito grande.
O Carmona veio a Paço de Arcos inaugurar a escola Dionísio Matias, estava eu na 1ª classe. Eu era pequenina e muito loirinha, e como estava na primeira fila, ele olhou para mim e disse: então minha pequenina tu já andas na escola? Eu devia parecer ter para aí uns 5 anos, mas tinha sete. Então ele deu-me um beijinho. Fui a única criança que ele abordou.
Também conheci muito bem a Amália Rodrigues, porque o meu irmão Manel era muito amigo do José de Castro desde os tempos de escola. O meu irmão era telegrafista na tropa, sabia Morse e isso tudo. Fez um aparelho para transmitir
e iam para a Regueira (como ele era comunista), embora o meu irmão não fosse de políticas.
O Zé dava-lhe fatos e camisas, e comia em casa deles porque esteve desempregado 3 anos. O meu irmão tomava conta de nós, as irmãs, e então levava-nos também lá a casa, e quando não havia mais nada, o Zé dava-nos queijo e manteiga, que não tínhamos em casa. Ás vezes também lá estava a Amália Rodrigues.
Quem por vezes aparecia era o Philip Taylor, que foi o primeiro ciclista de Paço de Arcos. Muito famoso (como ciclista), a bicicleta dele está no museu do Caramulo. O Armando conheceu-o; o prédio do Guedes era dele. Foi lá que ele nasceu e morou. Era dono dos Armazéns Godinho onde era o Seco. Morreu com 88 anos. Era atleta, fazia pesos e halteres."
Relato na primeira pessoa de uma conversa com a Liliana e com o bardino Fernando Reigosa.
Colaboração do Bardino Fernando Reigosa.
A Floripes tem memória de muitas coisas, porque também era grande entusiasta do teatro. Antes do meu tempo, também houveram muitas peças representadas no clube, com ela a minha irmã Preciosa e a minha cunhada Conceição.
Quem fazia todas as encenações eram o Tavares (que era professor, e estava proibido de dar aulas por razões políticas) e a Bébé. Este Tavares era filho da nossa professora, mas estava mais adiantado, porque a mãe só tinha a quarta classe. Ele é que ensinava a admissão ao liceu e dava explicações para o primeiro ciclo do liceu.
O João Vasco gostava muito de mim. Quis-me levar para o teatro, a minha mãe é que não deixou. Ele era muito meu amigo, as pessoas até pensavam que éramos namorados, mas não até porque ele nunca gostou de mulheres. Ele era o nosso ídolo. Tem mais dois anos que eu mas adorava-me. Ainda um dia destes perguntei á irmã como se chamava ele, porque para mim era sempre o Fernando.
Eu não fui para o teatro porque a minha mãe não me deixou. Primeiro era preciso dinheiro e eu tinha que trabalhar. Ela não se importava, mas eu tinha que me sustentar, vestir e calçar, e o teatro não dava dinheiro. Tinha 12 anos e o meu pai já não podia sustentar-me.
Em conversa um dia destes com o Paulo Brás perguntei-lhe:
- Tu lembras-te das peças de teatro?
- Se me lembro, eu fazia, nem quero que saibam agora, fazia de Salazar.
- Olha eu, como sabes fazia teatro, entrava em todas a s peças, ali em baixo no clube primeiro e depois passou para o cinema (Cine Teatro de Paço de Arcos) porque era maior e as pessoas tinham onde se sentar. As pessoas iam de graça, algumas davam qualquer coisa, para a ajuda das despesas que eram muitas.
Um dia destes vi a Tanica. Ela e a Nani (irmã do Pereira Júnior), eram muito amigas, as mães também eram muito amigas, eram ricas, andavam nos chás, não andavam com a minha mãe. Mas elas andavam connosco, eu era pobre, até podia andar descalça mas ia comer a casa delas.
A Tanica, não consigo lembrar-me qual era o nome, mas tenho a impressão que era Teresa, casou com o filho do dono dos fogões Hipólitos, que na altura era coisa boa; a cabeça do fogão nunca se estragava, enquanto os outras custavam dez escudos, os Hipólitos custavam 50 escudos. Eu fui lá ver com a Nani, ali na Lapa, uma casa muito chique, uma vivenda muito grande.
O Carmona veio a Paço de Arcos inaugurar a escola Dionísio Matias, estava eu na 1ª classe. Eu era pequenina e muito loirinha, e como estava na primeira fila, ele olhou para mim e disse: então minha pequenina tu já andas na escola? Eu devia parecer ter para aí uns 5 anos, mas tinha sete. Então ele deu-me um beijinho. Fui a única criança que ele abordou.
Praia das Fontaínhas, com Firmino, ‘bon vivant’, que ao que consta
nunca trabalhou, vivendo ás custas da mãe e das tias, e que morava
na casa hoje Restaurante Dízima, mesmo em frente aos Socorros
a Náufragos. Agosto de 1958, já casadinhos, presumivelmente,
Liliana e seu ‘mais-que-tudo’ Armando ‘carinhas’ Aires.
nunca trabalhou, vivendo ás custas da mãe e das tias, e que morava
na casa hoje Restaurante Dízima, mesmo em frente aos Socorros
a Náufragos. Agosto de 1958, já casadinhos, presumivelmente,
Liliana e seu ‘mais-que-tudo’ Armando ‘carinhas’ Aires.
Também conheci muito bem a Amália Rodrigues, porque o meu irmão Manel era muito amigo do José de Castro desde os tempos de escola. O meu irmão era telegrafista na tropa, sabia Morse e isso tudo. Fez um aparelho para transmitir
O Zé dava-lhe fatos e camisas, e comia em casa deles porque esteve desempregado 3 anos. O meu irmão tomava conta de nós, as irmãs, e então levava-nos também lá a casa, e quando não havia mais nada, o Zé dava-nos queijo e manteiga, que não tínhamos em casa. Ás vezes também lá estava a Amália Rodrigues.
Quem por vezes aparecia era o Philip Taylor, que foi o primeiro ciclista de Paço de Arcos. Muito famoso (como ciclista), a bicicleta dele está no museu do Caramulo. O Armando conheceu-o; o prédio do Guedes era dele. Foi lá que ele nasceu e morou. Era dono dos Armazéns Godinho onde era o Seco. Morreu com 88 anos. Era atleta, fazia pesos e halteres."
Relato na primeira pessoa de uma conversa com a Liliana e com o bardino Fernando Reigosa.
Colaboração do Bardino Fernando Reigosa.
2 comentários:
Só uma pequena nota: o Firmino morava na casa ao lado do referino, do outro lado da travessa,até havia no rés-do chão um estofador,e nas trazeiras da guarda fiscal, onde hoje é o restaurante, morava um senhor que era comissário de navios,se não estou errado,
Cumprimentos
Virgilio Miranda
Basto grato Virgílo Miranda. É sempre bom precisar as memórias, que já vão escapando.
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