1 de dezembro de 2009

MONOGRAFIA DE PAÇO DE ARCOS (Apontamentos) 03

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Senhor Jesus dos Navegantes
Padroeiro da Gente do Mar



O centro da vida religiosa desta vila, é, evidentemente, a histórica Ermida do Senhor Jesus dos Navegantes. A sua construção deve ser anterior a 1698, visto que, nesta data, era propriedade de D. Teresa Eufrásia de Meneses.

Em 1758, o culto era custeado pela irmandade que existia na freguesia de S. Roque, de Lisboa, e o padre cura, ao tempo, Padre Francisco dos Santos, tinha de rendimento anual, além de uma pipa de vinho, trinta alqueires de trigo.



Já então a imagem do Senhor Jesus dos Navegantes era muito venerada, não só pela classe marítima local, mas também pela gente que frequentava a baía e nela vinha abrigar-se em ocasião de temporal.

Em 1782, a ermida ficou pertencendo ao Hospital de S. José. No ano de 1877, foi reedificada a expensas do cofre do Hospital de S. José e de algumas esmolas particulares, sendo enfermeiro-mor, António José Torres Pereira.



Pinho Leal no seu livro "Portugal Antigo", vol 7º., escrevia o seguinte: "esta formosíssima capela do Senhor Jesus dos Navegantes, ao qual os povos destes sítios dedicam fervorosa devoção, foi benzida em 8 de Setembro de 1877. Foram dois dias de sumo regosijo e de pomposas festas para este bom povo. Houve de tarde um esplêndida procissão e concorrido arraial, onde tocou a banda de infantaria nº 1. Na véspera houve uma linda iluminação e fogo de artifício. Foi iniciador desta festa o legendário Patrão Joaquim Lopes, que confiado na sua coragem e fé no divino protector dos navegantes, tantas vidas tem arrancado à morte, nas revoltas ondas do Oceano. Desde o dia 8 de Setembro do ano supra, principiou, também, nesta capela a haver missa todos os domingos e dias santificados".

Podemos, pois, afirmar que o Patrão Joaquim Lopes foi o primeiro mordomo da festa em honra do Senhor Jesus dos Navegantes. E desde então, os habitantes de Paço de Arcos têm tido sempre uma grande fé e veneração pela imagem do Senhor Jesus dos Navegantes.



Ricos e pobres, nobres e plebeus, gente do mar e homens que se dedicam ao comércio e indústria, têm sempre tido uma grande devoção ao Senhor Jesus dos Navegantes.

O Patrão Joaquim Lopes nunca partia para o mar sem recomendar à esposa que rezasse por ele ao Senhor Jesus dos Navegantes.



Carlos Eugénio Correia da Silva, na sua biografia escrita em 1878, refere-se à fé viva e confiança inabalável do Patrão Lopes, no Senhor Jesus dos Navegantes e na Virgem Nossa Senhora da Bonança: "A noite vai negra. A tempestade rugindo soberba assola e devasta o espaço. Noite de horror. De espaço a espaço por entre o fragor da natureza em luta, ouvem-se ao longe, do lado do oceano, uns sons quase abafados mas sinistros, que não fazem parte do estrondear da tormenta, são tiros de socorro. É o canhão das fortalezas da barra chamando o auxílio dos homens para a tremenda batalha com o poder de Deus. Ouviu-os o Patrão Lopes, que o sono cortado por cuidados é leve e sem sossego. A fronte iluminou-se-lhe, os olhos despedem chamas de coragem, a boca entreabe-se com o sorriso dos mártires. "- Mulher reza a Deus, Senhor Jesus dos Navegantes, por mim. Um abraço. Até à volta". "- Onde vais Joaquim? Que fazes? " diz a triste, enlaçando-o com os braços. "- Deixa-me, vou onde o dever me chama, à barra, que de lá pedem socorro". "- Com tal tempo é tentar a Deus. Não me deixes Joaquim!". "- Mulher, que me enfraqueces, e há homens em perigo. Afasta-te". "- E a tua filha, se tu me faltas?". "- Outros lhe valerão. E de mais a Virgem Nossa Senhora da Bonança vigia por mim, que vou em seu serviço". "- Não te exponhas mais, meu homem, tens mulher e tens filhos". "- Aqueles também têm mulher e têm filhos, têm irmãs e choram por elas. Arriba rapazes. Quirino, Carlos, vamos que é tempo." "- E também os filhos", diz a desolada mãe prostrando-se reverente perante o oratório. E com as mãos postas e as lágrimas a correr, pede a Deus, ao Senhor Jesus dos Navegantes pelos náufragos e pelos salvadores".

Que grande heroísmo e que grande fé a deste benemérito Patrão Lopes!



A imagem do Senhor Jesus dos Navegantes venera-se na ermida do mesmo nome. Todos os anos, no último domingo de Agosto se realizam grandiosas festividades em honra do padroeiro da gente do Mar.




Texto de M.P. Videira em, "Monografia de Paço de Arcos (Apontamentos), 1947.




Colaboração do Bardino Vitor Martinez.


1 comentário:

Fernando Reigosa disse...

Aqui está mais um belíssimo exemplo de excelente história desta ÚNICA Vila.
É pena que textos e memórias deste nível andem como que escondidos, e não sejam mais divulgadas.
Será que as nossas crianças alguma vez perceberam, de facto, o peso histórico da sua terra?
E são uns 'gajos' abardinados que têm que arregaçar as mangas, queimar as pestanas e o seu tempo?
Duvido que seja a melhor maneira de repôr Paço de Arcos no mapa, mas se quem tem os meios não avança....
Podem contar conosco, pelo menos enquanto houver um Vitor Martinez que se desddobra em actividade altamente produtiva. Sem ele não iríamos muito longe, razão pela qual seria altura de haver mais umas vontades a juntarem-se a esta autêntica saga.
'Bora' lá pessoal.