24 de fevereiro de 2010

1992

actualidade antiga
(ou será vice versa?)

Em Paço de Arcos ou qualquer outro sítio. Talvez.


No longínquo ano escolar 1992/1993, os alunos da Escola Preparatória de Paço de Arcos, da turma 7º B, com o apoio dos professores, desenvolveram volumoso trabalho, publicado ‘universalmente’ numa bonita brochura, que se intitula “UM BREVE OLHAR SOBRE PAÇO DE ARCOS” ….a preto e branco (cores únicas da publicação).

Percorri-o com muito prazer, e fiquei espantado com alguns dos escritos, a sua ingenuidade mesclada com aquela sabedoria que muitas vezes vamos perdendo ao longo dos anos, e a sua pureza.




Vou reproduzir aqui três peças, com intenções diferentes:

- A introdução.

A análise da situação social e física da Vila, os comentários e as hipotéticas propostas, são de uma actualidade extraordinária. Se repararmos nos dois últimos parágrafos, sintetizam em poucas palavras o que uma enorme quantidade de ‘maduros’ andam a dizer (hoje), á boca pequena embora, umas vezes, outras com outros meios como esta ‘montra’. Mas fizeram-no com uma coerência inquestionável.

Só que nenhum dos responsáveis autárquicos deu seguimento (ou ouvido) àquilo que o resto dos ‘indígenas’ pensam ser o ‘ovo de Colombo’, nem sequer o então Presidente da Junta de Freguesia, que elogiou simpaticamente a iniciativa.

Talqualmente todos os outros, sucessivamente, têm vindo a fazer.




E nós queixamo-nos em particular, porque nos parece que nos consideram uma excrescência incómoda.

Afinal é apenas mais do mesmo. Repetimos queixas antigas que as sucessivas (in)governações autárquicas se mostraram incapazes (para ser simpático) de solucionar.

Tantos anos depois ???????????? Já era tempo.


“I N T R O D U Ç Ã O

Paço de Arcos encontra-se situado na foz e a norte do rio Tejo, com Oeiras a Oeste, Carnaxide a Leste e Barcarena a norte.

Foi o Palácio que deu nome a esta Vila.



Paço de Arcos era apenas uma terra de pescadores desenvolvendo-se na época do Marquês de Pombal.

Após o grande terramoto de 1755, inicia-se a construção da doca, com a finalidade de fornecer abrigo aos muitos barcos que aqui afluíam.

É elevada á categoria de Vila e sede de freguesia em 7 de Dezembro de 1926 com as localidades de Paço de Arcos, Lagoal, Caxias, Cartuxa, Gibalta, Laveiras, Murganhal, Terrugem de Baixo e de Cima, Fonte de Maio e Espargueira.

Com uma localização privilegiada entre colinas e Tejo, a freguesia é rica em património construído.




Na década de 60 inicia-se uma onda desenfreada de urbanizações; do convívio quase familiar passa-se para uma freguesia dormitório.

A proximidade de Lisboa atrai grande número de pessoas das áreas rurais, que aqui se fixam muitas vezes em condições precárias.

O equilíbrio de Paço de Arcos tem sido difícil de obter; faltam ainda espaços verdes, lugares de convívio, bibliotecas, salas de cultura; as praias, espaço de lazer importante, deveriam no mais curto espaço de tempo, voltar a desempenhar a sua vocação.


Só assim será possível, a freguesia de Paço de Arcos hoje com 32.000 habitantes, encontrar o caminho do desenvolvimento no sentido do bem-estar das populações e da sua progressiva humanização.”


- O Palácio

É uma abordagem ternurenta, do mais bem conseguido que alguma vez nos foi dado observar.

Não perde a essência do histórico passado, nem o romantismo subjacente. Retrata os aspectos fundamentais, e realça as vertentes únicas da Paço de Arcos; a sua ligação íntima ao mar, o seu passado ‘provinciano’, e a sua escolha preferencial pela nobreza reinante.

Mais, a sua estatura altiva, afrontando o mar, e albergando os deleites de quem tivesse paixão pela ‘coisa marítima’.


O PALÁCIO
(na primeira pessoa)

“Eu, Palácio:




Pediram-me para falar de mim…. Meu Deus, mas já todos me conhecem!...

Pronto, lá vai, não quero ser antipático……

Sou o Palácio dos Arcos, assim conhecido pelos arcos de volta perfeita que podem ver na minha fachada.

Logo de manhã, quando os primeiros raios de sol aparecem, cumprimento o meu velho amigo Tejo e miro-me vaidoso nas suas águas que, infelizmente, já não são tão cristalinas… Ai!..... que saudades eu tenho daquele Tejo bem azulinho que chegava a confundir-se com o azul de céu.

Que me lembre, sou habitado há séculos por famílias ilustres. O meu mais antigo titular o Sr. D. Antão Homem, fidalgo autoritário e ambicioso, mas amigo do seu amigo. Depois dele outros se seguiram.

Que me perdoem esses meus senhores que Deus tem na sua eterna glória, mas não vou falar deles, pois seria tremendamente fastidioso para vocês.

É verdade, só vos vou falar da Sra. D. Teresa Eufrázia de Menezes, porque, ainda hoje, o povo, mais por tradição do que por crença, fala da misteriosa lenda, que conta que a velha senhora em certas noites aziagas se desprende da moldura do quadro que está no salão, e vagueia pelos meus corredores e salas, suspirando, coitadinha, por um desejado herdeiro que infelizmente nunca apareceu.

Mas, verdade, verdadinha que eu nunca a vi nessas andanças, certamente porque acontece em noites em que me sinto mais cansado e não há nada, nem mesmo a Sra. D. Teresa Eufrázia de Menezes que me faça acordar………

Hoje passeia-se pelos meus corredores e salões o terceiro Conde de Arrochella e Castelo de Paiva, que me adora e que gosta de dizer, com graça, que não sou um palácio, mas sim uma casa de família, (por onde passaram várias gerações de gente honrada) a quem teimam em chamar Paço dos Arcos. Tudo bem, não me ralo, palácio, paço, mansão ou casarão, sem dúvida serei sempre um edifício carregadinho de História e estórias, que deu nome a esta graciosa e aristocrática Vila, que se honra da minha presença e que tenho visto crescer em tamanho, enquanto eu vou somando anos da minha vida.

Bom, como os séculos vão pesando e a memória já me falha, perdi, no tempo, a data exacta do meu nascimento. Dizem os entendidos que devo ter pelo menos 4 séculos de existência, mas eu, para datas, nunca fui bom!……….

O que sei, é que continuo a ter uma imponente e equilibrada fachada com dois torreões, um em cada lado, ligados por uma sóbria mas bonita varanda, sustentada em três arcos, onde adoro, em horas calmas, tomar uns banhitos de sol. Talvez seja esta fachada o que lembre a época manuelina. De tudo o resto, sei que fui restaurado no tempo do Sr. Marquês de Pombal, Conde de Oeiras, no sec. XVIII.

A minha varanda é importante, tem história, pois daqui o Sr. Rei D. Manuel I assistiu á partida das caravelas do Gama para a longínqua e sonhada Índia das especiarias. Com ele estava gente da corte, muito bem vestida, muito risonha e feliz, antevendo concerteza, os lucros chorudos que de lá chegariam……..



Lembro-me que este Rei, amante da caça, como todos os da sua classe, aqui vinha acompanhado de grande comitiva para fazer batidas aos coelhos, á noitinha; tudo terminava com grande banquete, onde se comiam os coelhos regados por belas taças de vinho da região.

Fui visitado por outras personagens reais; pelos Srs. D. Fernando, D. Luís e pela Rainha Sra. D. Maria Pia, grande amante de desportos náuticos e que da minha varanda assistiu ao desenrolar de animadas regatas que decorreram no Tejo. Á laia de despedida, aqui esteve o Sr. D. Manuel II, a observar a primeira experiência de torpedo fixo, um mês antes da queda da Monarquia.

Bom, modéstia á parte, tudo isto me faz estar orgulhoso de mim, porque sou uma gotinha de história de Paço de Arcos e do meu longo e rico diário."


O vosso amigo Palácio de Paço de Arcos.




- A foto

A referência aqui tem a ver, apenas com o facto de estarem sentados á mesma mesa duas personagens já aqui ‘cantadas’ e homenageadas, em circunstâncias e por razões diferentes, mas ambas merecedoras do mais completo respeito e memória de todos os Paçoarquenses.

Não poderemos deixar de referir, até pelo verdadeiro significado histórico e cultural, que há mais de 16 anos atrás, uns quantos miúdos já tinham percebido a importância destas duas personagens na história da Vila, do Concelho e de Portugal. E é quando aqueles miúdos já são adultos que uns velhotes têm que lembrar(re?) aos executivos autárquicos parte do (real) património da terra?

Apetece parafrasear ‘bem-aventurados os pobres de espírito, deles será o reino dos céus’. Nós aqui temos lugar garantido no inferno. Tal como na política vigente.




PS (post scriptum, que não partido político):

Não poderia acabar sem vos mostrar um soneto reproduzido neste livro, que ilustra bem a pureza ingénua, mas, por isso mesmo, salutar e verdadeira, essencial (de essência):



O CORETO




O Coreto


No Coreto

A banda toca,

O coro canta,

E o som paira no ar….

Entre os verdes do jardim,

Ergue-se do chão

Imponente,

Vistoso,

Mantendo a tradição.

Resistindo a tempestades,

Sofrendo tormentos,

Vive:

Lamentos,

Desejos,

E risos trazidos pelo vento……







Colaboração do Bardino Fernando Reigosa.


2 comentários:

vitor martinez disse...

excelente, este trabalho de jovens sobre a nossa vila!

ao ver a foto em que eles estão a entrevistar os saudosos Vilaverde e Elisiário, veio-me à memória o que a bardinagem podia fazer, se, além destes dois maduros que dão aqui ao dedo, houvesse mais pessoal a fazer algo por isto e por Paço de Arcos!!

bem hajam aqueles que um dia aqui se juntem!!!!

vitor martinez

Anónimo disse...

Amigo Fernando
No dia oito de janeiro de 1969, fui morar para o prédio que mostra numa das fotos(a que tem os moinhos, no largo em frente ao restaurante Os Arcos), e começou nesse dia a minha ligação a Paço de Arcos.
Um abraço
Virgilio Miranda